Medalha de prata


Carol Canabarro

Você já teve um sonho desfeito?

Aquele de casar debaixo de uma figueira, com o sol pintando a vida de sépia? Ou um trabalho, que permitiria presentear seus pais com uma casa na praia, só para que pudessem ver os netos construindo castelos de areia?
O sonho do segundo filho que não veio? Quem sabe até o primeiro. A graduação não concluída para cuidar do tio enfermo? O “eu te amo” não dito, porque você pensou ter mais tempo? A mudança, que você achou que deveria ser de estado, mas era só de perspectiva e, jovem demais, não soube ler nas entrelinhas do Universo?

É com você que falo. Com você que olha sua vida de rotina, de sonhos desfeitos e lamenta. Lamenta o que não foi, o que poderia ter sido. Que chora quando mergulha no mar, na esperança da sua água salgada dissolver-se na imensidão do oceano. Essas palavras são para você. Me dá a mão. Senta. Respira. E olha.

Absorve.

Esquece a porta fechada e entra pela fresta da janela. Sente o calor no olhar da amiga que aprendeu com seu erro. Celebra o filho que passou a (não) acreditar em uma divindade. Abraça a mãe que se soube reconhecida. Vibra com a irmã, que te usou de inspiração para alçar voos maiores. Se orgulhe do chefe, agora mais gentil, depois do seu pedido de demissão. Ronrona com o gato de rua que ganhou uma casa pela sua intervenção.

Olha, mas garante ver a medalha de ouro tão almejada se transformar em amizades para uma vida inteira. E ser mais. E ser maior.

Aprende que a vitória, a conquista, não está no plano terminado, mas no que você fez dos seus sonhos, principalmente, os desfeitos.

Do quanto você construiu por sobre escombros e cinzas. O tanto de gente que se levantou por se inspirar na sua história, apesar de você ter (em muitos momentos) se sentido diminuída.

Pendura no peito, com orgulho, a medalha de prata, exibe a redenção de não ter alcançado tudo o que pretendia, mas ter realizado muito mais do que imaginou.

Não se envergonha de ter perdido a final, mas aprende com o momento, transcende e se apruma. Quando uma partida termina, outra acaba de começar. Revisa e redesenha seus sonhos desfeitos, espreme a dor e, de verdade, comemora. Não a derrota, mas a possibilidade de se reconstruir de novo e de novo. Quantas vezes forem necessárias.

Por certo, sua parede tem menos medalhas do que você gostaria, mas transborda vitórias impossíveis de medir em metal.

voltar

Carol Canabarro

E-mail: carolinecanabarro@gmail.com

Clique aqui para seguir este escritor


Site desenvolvido pela Editora Metamorfose